Gustavo Ferrari durante palestra no congresso da Abraji
Na semana passada, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), acuado por denúncias de irregularidades - diga-se de passagem, graves o suficiente para que o colega de partido e correligionário Pedro Simon (RS) defendesse abertamente seu afastamento -, subiu à tribuna para fazer um desabafo que já se tornou clichê em casos assim.
Para Sarney, o tsunami de escândalos que o tem atingido - e que outro senador peemedebista, Álvaro Dias (PR), definiu como uma tragédia ética que se abate sobre o Senado -, não passa de uma campanha pessoal movida pelo jornal O Estado de S. Paulo, que os demais veículos de imprensa acabam repercutindo.
Mesmo sem querer, Sarney tirou o chapéu para a qualidade do jornalismo investigativo praticado em relação ao Senado e à sua pessoa. Fossem efetivamente mentirosas as denúncias, o senador pelo Amapá subiria à tribuna com documentos e provas para demonstrar cabalmente sua inocência.
Político veterano com passagem pelo cargo mais alto do país, Sarney deveria saber que só ataca o jornal quem não consegue responder aquilo que o jornal publica. Tentativas de tapar o sol da informação com a peneira da campanha movida pela imprensa funcionam, na prática, como uma confissão implícita de que as acusações são irrespondíveis. Na falta de argumentos para rebatê-las é que se apela para a desqualificação de quem as veiculou.
As descobertas de irregularidades praticadas pelo Senado não teriam existido sem um jornalismo competente, marcado pela independência em relação aos ocupantes do poder e pelo compromisso ético com a população à qual a imprensa se dispõe a servir. Esse jornalismo é, ainda, pedra rara no garimpo da imprensa.
Embora a expressão jornalismo investigativo pareça um pleonasmo - é impossível imaginar uma forma de jornalismo que prescinda da investigação -, a verdade é que nem tudo o que se publica ou se leva ao ar é feito com profundidade, abrangência, conhecimento e capacidade de desconfiar.
O jornalismo burocrático e de serviços, que se contenta em reproduzir press-releases e fazer a cobertura da agenda mais superficial de cada dia, fez escola no Brasil e afastou leitores dos jornais impressos nos últimos anos.
Erick Pinheiro/Guga fala sobre o case 'Trabalho Infantil'
Não é uma coincidência que o jornalismo investigativo, assim como o bom texto e a reportagem de fôlego, voltem a ser valorizados ao final de um tempo de imediatismos e concepções distorcidas, em que as notícias encolheram em tamanho e profundidade.
No novo cenário da imprensa mundial, a internet pulverizou a informação de tal forma que se tornou impossível competir pela preferência dos leitores apenas com serviços e coberturas pontuais. Ninguém pagará para ter esse tipo de material, disponível em profusão na web.
A briga pela liderança entre os órgãos de imprensa, sejam eles impressos, eletrônicos ou on-line, depende cada vez mais do material exclusivo, da reportagem bem apurada, do texto bem escrito e, principalmente, da credibilidade de quem informa - coisas que não se encontra com facilidade por aí.
Este jornal fica feliz por constatar que está absolutamente sintonizado com essa visão moderna e democrática de jornalismo, ao colocar entre suas prioridades a lavra de informações exclusivas, sem descuidar dos princípios éticos, da qualidade da informação e da independência editorial.
Um resultado palpável dessa postura foi colhido recentemente, com a participação de dois repórteres desta casa, Gustavo Ferrari e Leandro Nogueira, como expositores, no 4º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo, promovido pela Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) entre os dias 9 e 11 de julho, em São Paulo.
O convite para que os profissionais participassem do evento mais importante do jornalismo investigativo no Brasil, expondo reportagens publicadas neste jornal, é um reconhecimento ao esforço de nossa equipe e aos valores que orientam o jornalismo praticado pelo Cruzeiro do Sul, de Sorocaba (SP), além de um estímulo para que procuremos melhorar cada vez mais.
Editorial do jornal Cruzeiro do Sul, de 21 de julho de 2009