Emídio Marques/CPI da Pedofilia vai à P2 em Sorocaba
Calado. Foi assim que o engenheiro Januário Renna portou-se diante do presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pedofilia, senador Magno Malta (PR-ES), ontem à tarde, durante encontro com promotores e delegados na penitenciária 'Antonio Souza Neto', a P2, em Aparecidinha.
O parlamentar intimou o ex-secretário de Administração da Prefeitura de Sorocaba a participar de uma audiência pública, programada para acontecer entre os dias 9 e 10 de dezembro, na Câmara Municipal, sob a condição de que se cooperar com os trabalhos desenvolvidos pela comissão (com denúncias de crimes), poderá obter benefícios da lei (delação premiada).
A 'reunião' na P2 durou duas horas. Renna não disse sim nem não. Informou às autoridades que pretende discutir o assunto com o seu advogado, o criminalista Mário Del Cístia Filho, e com a própria família, para depois se posicionar. Porém, ouviu de Malta que uma nova lei, a ser sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em dezembro, que concede 30 anos sem progressão de regime para o pedófilo e rastreamento eletrônico até a morte, pode contribuir para atenuar as penas, caso venha a ser condenado pelo juiz Hélio Villaça Furukawa.
"Disse a Renna que se ele entregar setores da sociedade (referindo-se a pedófilos), que possa mudar a vida de São Paulo, já é um ganho muito grande para todos. Ele ficou calado durante o encontro, mas agradeceu a vinda da CPI. A conversa do acordo (delação premiada) tem de ser feita antes da sentença. Coloquei todos os direitos e benefícios da lei e ele ficou de estudar", destacou Malta. Para Mário Del Cístia, "Renna não é pedófilo".
A comitiva chegou em Salto às 11h. Lá, o presidente da CPI, ao lado da psicóloga judiciária Tatiana Hartx, ouviu, durante quatro horas, as nove meninas que teriam sido vítimas dos abusos de Renna, no Conselho Tutelar. Todas colaboraram e confirmaram os fatos contidos nos dois volumes do processo, que corre na 2.ª Vara Criminal de Itu.
"O processo está muito bem conduzido pelo Ministério Público. Vim para cá balizar o comportamento da CPI daqui pra frente. Entendemos a denúncia e, agora, precisamos tomar atitude a partir do depoimento das crianças; para isso, trouxemos a psicóloga judiciária, que ouviu-as aqui, para que não fossem levadas a Brasília", ressaltou o senador.
Perícia
Malta interessou-se pelo resultado da perícia feita nos computadores de Renna, que ainda não está concluído. Ele acredita que até a segunda semana de dezembro, entre os dias 9 e 10, novas provas contra o ex-secretário surgirão.
"A perícia dos computadores oferece duas coisas significativas, entre elas a criminalização da posse, que é uma lei recém-sancionada. Havendo material pornográfico no computador, o réu pode pegar até oito anos de prisão. Se for comprovado que ele (Renna) postou material pornográfico de fotos que mesmo fez, a tipificação de conduta do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) diz que a pena dobra para mais oito anos. Só aí serão outros 16 anos de prisão", argumentou.
De acordo com o parlamentar, "ninguém desequilibrado e dopado conquista tanta menina em um dia só e leva três, quatro, para o motel". Por isso, não descarta a possibilidade de haver, na região de Sorocaba, uma rede de pedofilia.
"A minha experiência pessoal diz que na tipificação de crime organizado, duas ou mais pessoas se reúnem para cometer o delito. Dessa forma, ninguém é pedófilo com um grupo significativo de crianças e adolescentes sem ter ajuda de alguém", sustentou.
Crimes pela web
Segundo o presidente da CPI, o Brasil é recordista em crimes de internet, e está entre os três 'maiores abusadores do Planeta'. "Aqui (em Salto) foram detectadas essas crianças do mesmo bairro (Jardim das Nações). Em Catanduva passam de 80 no mesmo bairro (crianças do acusado de pedofilia Zé da Pipa). O que fica de pedagógico nessas revelações é a mesma coisa que nos envergonha. Há a necessidade de agirmos, muito rapidamente, para que o Poder Público cumpra o seu papel e se levante como cooperador no sentido de fazer a sociedade cumprir o seu. Políticos, polícia, Ministério Público, Conselho Tutelar... Todos agem com a porta arrombada, pois já houve o crime, já teve criança abusada, já tem criminoso para prender, denunciar, sentenciar. Não é disso que precisamos e não é isso que vai resolver o problema social. Precisamos de um comportamento em que a família se compenetre com sua responsabilidade. E criação de filho é responsabilidade de pai e mãe", ao referir-se a novos casos diários que surgem de pedofilia no país.
Cooperação
Para o senador, o Poder Público pode ser o cooperador no combate à pedofilia, no sentido de se fazer multiplicador do comportamento preventivo, ao mesmo tempo que multiplicador no sentido de socorrer a sociedade às suas necessidades "mais gritantes num momento como este".
"Tem muita gente, de forma sacerdotal, cumprindo um papel do Estado, que não faz por que não sabe fazer e não deve se meter. O Estado poderia ser cooperador e chamar essa gente para dentro, para que fossem parceiros, como as ONGs, igrejas (que recupera drogados, viciados em crack), pastorais (pegando meninas prostituídas, pois não se tem prostituição infantil, mas sim criança levada para a prostituição). Por isso, argumento de defesa de pedófilo não presta e não vale. Não existe criança prostituta. Alguém conduziu, induziu. Se a mãe ou o pai favoreceu, precisa ser punido. Isso está na lei", acrescentou.
Como lembrou, há um ano e sete meses "ninguém sabia a dimensão dos crimes de pedofilia no Brasil. Tinha a certeza de que era um monstrinho... A sociedade acordou e justamente esse acordar é que me traz aqui, pois temos um caso emblemático. Hoje, ela (sociedade) fala, denuncia, não tem mais medo de entregar e não quer saber de convivência com pedófilo. Não dá para fazer um discurso na Tribuna do Senado e não correr para ajudar as famílias. Salto é tão difícil e problemático como outras regiões do país", concluiu.
by Gustavo Ferrari