terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Renna deixa prisão e vai para condomínio de luxo

Fábio Rogério/Ex-secretário deixa P2 no começo da noite
Após 165 dias encarcerado na Penitenciária 'Antônio Souza Neto' (P2), o ex-secretário de Administração da Prefeitura de Sorocaba, Januário Renna, de 63 anos, foi solto, no começo da noite de ontem, por determinação dos desembargadores Ivan Marques da Silva e Francisco Orlando de Souza, ambos do primeiro grupo da segunda Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ).

Eles concederam habeas corpus (hc) ao réu sob a alegação de que o prazo para ele ser julgado expirou. Pelo código de processo penal, uma pessoa presa em flagrante não pode permanecer detida por mais de 81 dias sem que haja condenação. Dessa forma, esgota-se o prazo para término da instrução processual, tornando-se a prisão um constrangimento ilegal. Porém, há jurisprudência contrária a esse entendimento.

O promotor do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), Wellington dos Santos Veloso, acredita que a decisão foi "equivocada". "Analisaram, apenas, as questões aritméticas (os prazos processuais). Esqueceram-se que este é um caso altamente complexo, justamente por ter diversas vítimas", apontou. A promotora de Itu, Mariane Schmidt, está em período de férias e não foi localizada para comentar a decisão.

Renna deixou a P2 às 18h, no carro conduzido pela filha do advogado criminalista Mário Del Cístia Filho. Demonstrava abatimento. "Ele está super contente por ter conseguido essa liberdade", disse o seu defensor à imprensa. Ao deixar o local, o trio tentou despistar os jornalistas enquanto seguia para Sorocaba. Antes de entrar na rodovia Castelinho, a filha do advogado fez retorno na alça de acesso a Aparecidinha e rumou sentido Itu, pela estrada velha, até chegar ao luxuoso condomínio Terras de São José, local em que o ex-secretário passaria a noite. "Ele está na casa de um amigo", ressaltou Del Cístia.

Segundo o criminalista, a soltura do réu começou a ser elaborada no final do ano passado, após as audiências dos dia 15 e 17 de dezembro. Ele requereu dois benefícios ao cliente no TJ: um pedido de relaxamento da prisão por excesso de prazo (há um prazo para o juiz iniciar e terminar o processo; esse prazo, segundo entende, foi superado por conta da complexidade do processo); o outro foi de liberdade provisória (um hc dentro do próprio hc).

"O pedido de liminar foi negado, mas ficou acertado, que, após as férias forenses, ia-se marcar o julgamento do pedido. Hoje iniciou-se esse julgamento, com a participação do Ministério Público (MP), com um procurador de Justiça, um desembargador presidente e três desembargadores votando. Foi concedido a ele a liberdade através do excesso de prazo, por dois votos a um", destacou Del Cístia.

Conforme o advogado, o desembargador relator do caso, Roberto Martins de Souza, votou pela não-concessão da ordem (benefício) nos dois sentidos. No entendimento dele, não estava ocorrendo o excesso de prazo, o que justificaria tal demora tratando-se de algo complexo. "Os outros dois desembargadores estavam até propensos a conceder a liberdade provisória, mas isso iria demandar, pelo menos, mais uma sessão de julgamento. Então, os dois concederam a ordem por excesso de prazo, determinando a liminar de expedição de soltura", acrescentou.

Há duas audiências de instrução marcadas para os dias 5 e 24 de março, quando serão ouvidas as 8 testemunhas de defesa. Del Cístia afirmou que Renna irá comparecer às duas. "Não tem perigo nenhum dele desaparecer. Tão logo seja intimado, comparecerá imediatamente", finalizou.

Flagrante

Renna foi preso, em flagrante, no dia 15 de agosto (aniversário de Sorocaba), por policiais da 5.ª Delegacia do Deic, da Capital, em um quarto de motel, com três menores (duas de 14 anos e uma de 15 anos), em Itu. Ele foi seguido pelos policiais, no momento em que saiu de Salto acompanhado das garotas, até a entrada do motel. Os policiais esperaram alguns minutos e o flagraram já no quarto com as meninas. Não resistiu à prisão.

Diligências da Delegacia da Infância e da Juventude (Diju) e da Promotoria da Infância e Juventude de Sorocaba encontraram outras vítimas de Renna. Oitivas (depoimentos) de outras seis menores -, que também teriam mantido relações sexuais com o acusado -, foram colhidos pelo titular da Diju, José Augusto de Barros Pupin, pelo delegado de Itu, Nicolau Santarém, e pelos promotores Antônio Domingues Farto Neto, Mariane Schmidt e Wellington Veloso.

2.181 fotos

No disco rígido (hd) do computador pessoal que o ex-secretário utilizava em seu gabinete, no 1.º andar do Palácio dos Tropeiros, a perícia do Instituto de Criminalística (IC) de Sorocaba encontrou 2.181 fotos de crianças, com idades entre 3 e 15 anos, nuas ou seminuas, sendo abusadas sexualmente ou em situações constrangedoras. Isso renderá um outro processo, que está em fase de elaboração pelo Gaeco.

Segundo apurou o jornal Cruzeiro do Sul, uma servidora lotada na própria pasta chegou a ser transferida para outro setor do Paço, após flagrar Renna acessando sites de pedofilia.

O MP pede que Renna seja condenado a 60 anos de prisão. Ele foi denunciado por seguidas violações aos artigos 218-B, 2.º parágrafo, inciso 1, do Código Penal (praticar conjunção carnal ou ato libidinoso com menor de 18 anos e maior de 14 na situação de prostituição ou exploração sexual, com pena que varia de 4 a 10 anos); 244-A, do Estatuto da Criança e do Adolescente (submeter ou explorar menor a prostituição, com pena que varia de 4 a 10 anos); 214, do Código Penal (constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso, com pena que varia de 6 a 10 anos).

by Gustavo Ferrari