O grande problema - já dizia um jornalista - não é o que sai nos jornais, mas o que não sai. Um jornal sem reportagens de peso é como uma padaria que vende de tudo, menos pão
A superoferta de informações é uma das características marcantes da vida moderna. Jornais, revistas, TV, rádio, internet e agora também celulares formam uma rede noticiosa em permanente atualização, que permite a qualquer pessoa, em qualquer lugar e independente do que esteja fazendo, acompanhar tudo o que ocorre no mundo à sua volta.
Mas, se a oferta de informação é generosa, falta-lhe, no mais das vezes, qualidade. Notícias superficiais, descontextualizadas, repetitivas, incompletas ou parciais - baseadas em declarações e press-releases, geralmente matizados pelas conveniências dos grupos que os fazem distribuir - contribuem para afastar a imprensa de sua missão.
E é por isso que o bom repórter jamais cairá em desuso. O repórter “farejador”, como se diz nas redações, capaz de driblar as dificuldades e garimpar as informações mais escondidas - o repórter com esperteza e sensibilidade para descobrir o que está errado e denunciar as injustiças -, tem nas mãos a essência do verdadeiro jornalismo. A informação que ele traz a lume é tão substancial que não se restringe a informar: ela transforma as pessoas e a sociedade.
Nada contra as receitas de bolos, os tutoriais de moda, as palavras cruzadas e os resumos de novelas. O grande problema - já dizia um jornalista - não é o que sai nos jornais, mas o que não sai. Algo vai mal quando a informação fica restrita ao serviço e ao passatempo. Um jornal sem reportagens de peso é como uma padaria que vende de tudo - menos pão.
Isso explica o orgulho que tomou conta desta casa quando, na sexta-feira (14/11), quatro dos nossos profissionais foram premiados na oitava edição do Prêmio ASI/Shaeffler Group de Direitos Humanos. Seus trabalhos pertencem a essa distinta categoria de reportagens escritas com inconformismo e indignação, atributos que nunca ficam embotados nos bons repórteres, mesmo depois de anos de serviço.
Coincidentemente, os três primeiros colocados na modalidade Jornalismo Impresso são companheiros da terceira turma da Uniso, formados em 2000. Gustavo Ferrari, o primeiro colocado, é pós-graduado em Jornalismo, Educação e Ciência pela PUC-SP e trabalha no Cruzeiro desde novembro de 2005. Wilson Gonçalves Junior, o segundo colocado (premiado pela reportagem “Eles tiram dinheiro de pedra”, publicada na “Folha de Votorantim”), trabalha na área desde 1998 e ingressou no Cruzeiro há apenas dois meses. Telma Silvério, a terceira colocada, é a mais antiga de casa: atua no Cruzeiro do Sul desde abril de 1992. Passou pelos setores da Digitação, Arquivo, Fotografia, Internet e Redação. Em 2003, já havia vencido o Prêmio Jornalístico ASI/LUK de Direitos Humanos, com uma reportagem sobre violência contra a mulher.
Ao repórter fotográfico Erik Pinheiro, contratado em novembro de 2007, coube uma dupla honraria. Com 12 anos de experiência em fotorreportagem, foi ele quem descobriu a pauta que deu origem ao texto premiado de Gustavo (“Infância comprometida”, Caderno de Domingo, 01/06/2008). E, trabalhando nessa mesma pauta, fez as fotos que lhe renderam o segundo lugar na categoria Fotojornalismo.
Erik e Gustavo foram várias vezes até um cruzamento do Campolim, onde dois irmãos de 14 e 10 anos vendiam salgados para os motoristas, em plena madrugada. Depois de uma aproximação lenta, ganharam a confiança das crianças e conseguiram chegar à mãe, que concordou em dar uma entrevista. Seu esforço mostrou a realidade do trabalho infantil, desmentindo a versão oficial, de que não existem crianças trabalhadoras na cidade. “A vitória - no meu ponto de vista - foi somente do jornalismo. Ele conseguiu que a família recebesse ajuda dos órgãos competentes (bolsa-família, bolsa-escola) e, também, fosse 'adotada' por um casal ligado à área da saúde, que tem doado, todos os meses, alimentos e mantimentos necessários”, afirma Gustavo.
E é essa vitória do bom jornalismo que este jornal compartilha com seus leitores, reafirmando seu propósito de buscar a informação com ética, coragem e independência, no interesse da comunidade e dos cidadãos.
Editorial do jornal Cruzeiro do Sul de hoje